Festival jazz.pt


2011

Crise obriga, o Festival Jazz.pt concentrou-se este ano em cinco concertos e duas salas. Os cinco concertos serviram de apresentação a cinco novas edições CD, o que em tempo de crise discográfica não deixa de ser assinalável, embora os CDs tendam a ser cada vez mais cartões de apresentação dos projectos e músicos. As editoras convocadas foram a JACC, proprietária da revista Jazz.pt e organizadora do festival, a Clean Feed ea Tone of a Pitch. O público afluiu razoavelmente aos primeiros dois concertos, no Arte & Manha, e rareou no Vinyl. Não assisti ao concerto do Óscar Marcelino da Graça Trio.

LAMA
Os LAMA, constituídos por Susana Santos Silva no trompete, Gonçalo Almeida no contrabaixo e electrónicas e Greg Smith na bateria, tiveram as honras de abertura do festival Jazz.pt. Música fria, desprovida de emoção, os LAMA não confirmaram a modernidade que anunciavam, e que se baseava, por um lado nas harmonias abstractas e por outro na electrónica. A electrónica em especial pareceu-me sempre dispensável, como uma forma de parênteses, abrindo e fechando as composições, nunca se integrando na estrutura dos temas, a desmerecer qualquer atenção. O trabalho de escrita revelou-se também relativamente insípido e apenas a intervenção da trompetista oferecia algum calor e interesse às composições.

Spyros Manesis Trio
O jovem Spyros Manesis apresentou no Vinyl o seu primeiro disco. Creio no entanto que ele é prematuro: o concerto não denotou nenhuma ideia original, enquanto do ponto de vista técnico, apesar de fluente, revelou-se excessivamente académico.

IntErLúNio
A formação relativamente atípica dos IntErlúNio denuncia desde opruimeiro momento as águas - do etno-jazz - por onde navega. Mas o que à partida parecia ser uma boa ideia: o encontro de duas culturas musicais; gorou-se na insipiência da execução. As percussões, a quem é oferecido um protagonismo excessivo, marcam a personalidade do grupo, mas são também a sua maior debilidade. Sem esclarecer o orientalismo: árabe? indiano? ou simplesmente flamenco?, tudo gira excessivamente em torno das tablas; mas tanto do ponto de vista técnico como do ponto de vista das ideias, o grupo acusou pouco trabalho. Salvou-se o trabalho dos sopros

Demian Cabaud Trio
O nome de Demian Cabaud é sempre causa suficiente para expectativas em qualquer concerto, e a apresentação do novo disco do contrabaixista no Vinyl não as desmereceu. Jazz sólido, próximo do que pratica o Fly Trio (Mark Turner, Larry Grenadier, Jeff Ballard), até pelo saxofone, muito contido, de José Pedro Coelho, quase nunca se deixou decair para caminhos menos seguros (excepção para a entrada do convidado Rui Teixeira no saxofone barítono, que nunca foi uma valia para o grupo), mas também não ousou voos mais largos. Os standards «Come Rain or Come Shine» ou «Humpty Dumpty», alternaram com originaisnum concerto agradável , mas sem história.

Sex 2-Dez
Lisboa
Arte & Manha
23.00
LAMA
Gonçalo Almeida (ctb, elec), Susana Santos Silva (t, elec), Greg Smith (bat)
Sáb 3-Dez
Lisboa
Arte & Manha
23.00
Óscar Marcelino da Graça Trio
Òscar Marcelino da Graça (p), Demian Cabaud (ctb), Marcos Cavaleiro (bat)
Qui 8-Dez
Lisboa
Vinyl
23.00
Spyros Manesis Trio
Spyros Manesis (p), João Hasselberg (ctb), Kaspars Kurdeko (bat)
Sex 9-Dez
Lisboa
Vinyl
23.00
IntErLúNio
Ricardo A. Freitas (g-b), Gonçalo Lopes (cl-b, cl-s), Johannes Krieger (t), Eduardo Lála (trb), Raimund Engelhardt (tablas, per)
Sáb 10-Dez
Lisboa
Vinyl
23.00
Demian Cabaud Trio
Demian Cabaud (ctb), José Pedro Coelho (st), Marcos Cavaleiro (bat)

 


2010

O Festival Jazz.pt #3 passou este ano para Santa Apolónia (Lisboa), entre o Odessa e o Lux Frágil. Espaços agradáveis, embora nem sempre com as melhores condições acústicas. O público acorreu em medida desigual, para resultados musicais também desiguais.

Grünen
Bastante aquém do prometido, os Grunen esclareceram ao vivo como é que conhecimento académico e (vontade de) radicalismo não chegam para construir música interessante. A fórmula do «vamos todos lá para a frente e logo se vê» tem os dias contados.

Afonso Pais Trio
O espaço – esplanada, apinhada e ruidosa - do Delidelux não foi generosa para Afonso Pais que apresentava Fluxorama, um disco onde a guitarra eléctrica é acompanhada de um hammond e uma bateria. Mas apesar da confusão foi possível observar (o que seria confirmado na audição do disco) como não basta ter um órgão para soar «à Jimmy Smith». Faltou blues.

The Core
O conhecimento que os The Core têm do Jazz é claramente académico, o que é denunciado pelas formas estilizadas e pela mistura: um pouco de bop, um pouco de funky e um pouco de rock até (que é claramente a sua música), sobre estruturas fluidas. A energia que colocaram no palco do Lux permitiu um concerto agradável.

Hasse Poulsen's Sound Of Choice
Aborreço-me quando num concerto os músicos trazem para o palco elementos perturbadores da simples audição da música. Ou melhor, o recurso a artifícios exteriores à música só deve ser autorizado como complemento e não em sua substituição. Não foi o caso do concerto dos HPSC, mais preocupados em chocar o público ou revelar-lhe a sua irreverência e eclectismo que em tocar. Som muito alto, noise, feedback, saltos em palco, gestos e roupa excêntricos, contribuíram para camuflar o que de interessante a sua música pudesse ter.

Shtik
Zeno de Rossi, mentor e baterista Shtik, apresentou no Lux The Manne I Love, disco da etiqueta El Gallo Rojo, música inspirada em Shelly Manne, uma lenda do Jazz. Música que tem tanto de híbrido quanto de pastiche, aliada a irreverência e humor, proporcionou um concerto bastante aprazível.

Desidério Lázaro Trio
Desidério é um saxofonista que, apesar da sua juventude, se tem revelado um dos nomes mais seguros do Jazz nacional. Saxofonista inteligente e imaginoso, possui uma linguagem culta que procura escapar à herança mais pesada de Coltrane, no que me parece por vezes uma versão modernizada do som do saxofone west coast. Posto isto, a fórmula trio de saxofone é uma fórmula pesada. A ausência do instrumento harmónico coloca o saxofone em evidência, obrigando-o a um esforço suplementar de que nem todos os saxofonistas são capazes. E nesse sentido, eu creio que o projecto trio de Desidério Lázaro é prematuro: a fasquia foi colocada muito alto e nem sempre ele conseguiu superá-la. Apesar de tudo, e naturalmente, o melhor concerto do festival.

 

Qua 8-Set
Lisboa
Odessa
24.00
Grünen
Achim Kaufmann (p), Robert Landfermann (ctb), Christian Lillinger (bat, per)
Qui 9-Set
Odessa
22.30
Afonso Pais Trio
Afonso Pais (g-el), Albert Sanz (ham), Luís Candeias (bat)
24.00
Faustino / Roder / Eberhard / Neuser
Rui Faustino (bat, per), Jan Roder (ctb), Silke Eberhard (sa), Nikolaus Neuser (t)
Sex 10-Set
Lux Frágil
22.30
The Core
Jørgen Mathisen (cl, s), Jonas Kullhammar (st, ss), Erlend Slettevoll (p), Steinar Raknes (ctb), Espen Aalberg (bat)
Odessa
24.00
Hasse Poulsen’s Sound Of Choice
Hasse Poulsen (g, g-el), Fredrik Lundin (st, ss, f, fb), Lars Juul (bat)
Sáb 11-Set
Lux Frágil
22.30
Shtik
Zeno De Rossi (bat), Achile Succi (clb, sa), Enrico Terragnoli (g-el), Alfonso Santimone (p, comp), Danilo Gallo (ctb)
Odessa
24.00
Desidério Lázaro Trio
Desidério Lázaro (st, ss), Mário Franco (ctb), Luís Candeias (bat)
Dom 12-Set
Odessa
19.00
Hugo Carvalhais “Nebulosa"
Hugo Carvalhais (ctb), Gabriel Pinto (p, sint), Mário Costa (bat), Émile Parisien (ss, sa)

Antecipação

O Festival Jazz.pt #3 passa este ano para Santa Apolónia (Lisboa), entre o Odessa e o Lux Frágil. Os grupos convidados são o trio alemão Grunnen, a 8, Afonso Pais e Faustino/ Roder/ Eberhard/ Neuser quinta 9, os noruegueses The Core e o trio Sound of Choices de Hasse Poulsen na sexta, os transalpinos Shtik e o Trio de Desidério Lázaro no sábado e o quarteto de Hugo Carvalhais no domingo. A minha aposta vai claramente para os portugueses Desidério Lázaro, Afonso Pais e Hugo Carvalhais.

Fazendo coincidir com os concertos serão editados durante o festival vários novos discos, da JACC e Clean Feed, mas também da Moserobie (Suécia), El Galo Rojo (Itália) e Quark Records (França).

Outros eventos são a organização de dois debates durante o festival sobre a edição discográfica, com a participação das cinco editoras atrás referidas, e a organização de festivais, que deverá contar com a participação de vários organizadores de festivais de Jazz nacionais.

Em diversos outros espaços culturais e comerciais do Cais da Pedra em Santa Apolónia, Lisboa – Loja da Atalaia, Bica do Sapato, Flur, Nord, Casanova, Delidelux (além dos já referidos Lux Frágil e Odessa/FactoLAB) – o festival organizará ainda uma feira de discos, exposições , etc.

Mais informação em http://www.jazz.pt/festival/index.html


2009

 Qui 3-Set
Lisboa
Hot Club
22-00
Alberto Pinton / Jonas Kullhammar Quartet
Alberto Pinton (sb), Jonas Kullhammar (st), Torbjörn Zetterberg (ctb), Kjell Nordeson (bat)
24.00
Alípio C. Neto & Angelo Olivieri Quintetto Harafè
Alípio C. Neto (st, ss), Angelo Olivieri (t), Ezio Peccheneda (g-el), Roberto Raciti (ctb), Ermanno Baron (bat)
Évora
Praça do Giraldo
19.00
Combo da Universidade de Évora
 
Espaço Celeiros
23.00
Jam Session
 
Sex 4-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
Jeffery Davis Quartet
Jeffery Davis (vib, mar), André Fernandes (g-el), Nelson Cascais (ctb), Carlos Miguel (bat)
24.00
Rodrigo Amado Motion Trio
Rodrigo Amado (st, sb), Miguel Mira (celo), Gabriel Ferrandini (bat, perc)
Évora
Teatro Municipal Garcia Resende
22.00
Big Band da Nazaré
Adelino Mota (dir), Joaquim Pequicho (sa), João Capinha (sa), André Murraças (st), Wilson Ferreira (st), Pedro Morais (sb), Vítor Guerreiro (t), Margarida Louro (t), Luís Guerreiro (t), André Venâncio (t), Reinold Vrielink (trb), Élio Fróis (trb), Luís Pires (trb), Fábio Matias (trb), Gonçalo Justino (g-el), Ricardo Caldeira (p), Tiago Lopes (b-el), Bruno Monteiro (bat), Júlia Valentim (voz)
Espaço Celeiros
24.00
Alípio C. Neto & Angelo Olivieri Quintetto Harafè
Alípio C. Neto (st, ss), Angelo Olivieri (t), Ezio Peccheneda (g-el), Roberto Raciti (ctb), Ermanno Baron (bat)
Sáb 5-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
Big Band da Nazaré
Adelino Mota (dir), Joaquim Pequicho (sa), João Capinha (sa), André Murraças (st), Wilson Ferreira (st), Pedro Morais (sb), Vítor Guerreiro (t), Margarida Louro (t), Luís Guerreiro (t), André Venâncio (t), Reinold Vrielink (trb), Élio Fróis (trb), Luís Pires (trb), Fábio Matias (trb), Gonçalo Justino (g-el), Ricardo Caldeira (p), Tiago Lopes (b-el), Bruno Monteiro (bat), Júlia Valentim (voz)
24.00
Mikado Lab
Marco Franco (bat), Ana Araújo (tec), André Matos (g-el), Pedro Gonçalves (b-el)
Évora
Teatro Municipal Garcia Resende
22.00
João Lencastre’s Communion
João Lencastre (bat), Phil Grenadier (t), Benny Lackner (p), Thomas Morgan (ctb)
Espaço Celeiros
24.00
Alberto Pinton / Jonas Kullhammar Quartet
Alberto Pinton (sb), Jonas Kullhammar (st), Torbjörn Zetterberg (ctb), Kjell Nordeson (bat)
Qui 10-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
Nuno Costa Quinteto
Nuno Costa (g-el), João Moreira (t), Óscar Graça (tec), Bernardo Moreira (ctb), André Sousa Machado (bat)
24.00
Jorge Moniz Quarteto
Jorge Moniz (bat), Mário Delgado (g-el), Júlio Resende (p), João Custódio (ctb)
Júlio Resende International 4tet com Ole Morten Vagan
Júlio Resende (p), Desidério Lázaro (st, ss), Ole Morten Vagan (ctb), Joel Silva (bat)
Évora
Praça do Giraldo
19.00
Combos da Universidade de Évora
 
Espaço Celeiros
23.00
Jam Session
 
Sex 11-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
LUME
Marco Barroso (dir, p), Manuel Luís Cochofel (f), Paulo Gaspar (cl), Jorge Reis (ss), João Pedro Silva (sa), José Menezes (st), Elmano Coelho (sb), Jorge Almeida (t), João Moreira (t), Pedro Monteiro (t), Luís Cunha (trb), Eduardo Lála (trb), Pedro Canhoto (trb), Miguel Amado (ctb, b-el), André Sousa Machado (bat)
24.00
Nobuyasu Furuya Trio
Nobuyasu Furuya (st, clb, f), Hernâni Faustino (ctb), Gabriel Ferrandini (bat, perc)
Évora
Teatro Municipal Garcia Resende
22.00
Paulo Gaspar and Friends “Tributo a Benny Goodman”
Paulo Gaspar (cl), Jeffery Davis (vib), Óscar Graça (p), Eduardo Lopes (bat)
Espaço Celeiros
24.00
Riccardo Luppi’s Murmure
Riccardo Luppi (st, ss, f), Lynn Cassiers (voz, elec), Manolo Cabras (ctb), João Lobo (bat)
Sáb 12-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
Riccardo Luppi’s Murmure
Riccardo Luppi (st, ss, f), Lynn Cassiers (voz, elec), Manolo Cabras (ctb), João Lobo (bat)
24.00
João Lencastre’s Communion
João Lencastre (bat), Phil Grenadier (t), Benny Lackner (p), Thomas Morgan (ctb)
Évora
Teatro Municipal Garcia Resende
22.00
LUME
Marco Barroso (dir, p), Manuel Luís Cochofel (f), Paulo Gaspar (cl), Jorge Reis (ss), João Pedro Silva (sa), José Menezes (st), Elmano Coelho (sb), Jorge Almeida (t), João Moreira (t), Pedro Monteiro (t), Luís Cunha (trb), Eduardo Lála (trb), Pedro Canhoto (trb), Miguel Amado (ctb, b-el), André Sousa Machado (bat)
Espaço Celeiros
24.00
Jeffery Davis Quartet
Jeffery Davis (vib, mar), André Fernandes (g-el), Nelson Cascais (ctb), Carlos Miguel (bat)

Na continuidade da bem sucedida experiência do ano passado, a revista Jazz.pt organiza a 2.ª edição do seu festival. A novidade é a extensão para a cidade de Évora; uma excelente forma de rentabilizar recursos. Os concertos irão assim decorrer entre o Hot Club em duas sessões diárias entre o clube e o jardim exterior, e Évora, em três espaços: a Praça do Giraldo, o Teatro Garcia de Resende e o Espaço Celeiros. Os concertos decorrem de 3 a 12 de Setembro, de quinta a sábado nas duas semanas.

A programação deste ano conta com uma forte componente nacional e alguns poucos grupos multinacionais. O meu destaque vai para a Lume Big Band, que nas raras aparições tem revelado um trabalho de composição raro de sofisticação e modernidade em Portugal. Expectativa para o novo grupo do inflamado Alípio C. Neto com Angelo Olivieri, confiança nos grupos de Jeffery Davis, João Lencastre, Nuno Costa, Jorge Moniz, Júlio Resende, na Big Band da Nazaré e Mikado Lab e ainda Alberto Pinton/ Jonas Kullhammar Quartet, Rodrigo Amado Motion Trio, Nobuyasu Furuya Trio e Paulo Gaspar «Tributo a Benny Goodman».


2008

Na celebração do terceiro aniversário da sua existência, a revista jazz.pt organizou o seu primeiro festival, que decorreu no Hot Club entre 4 e 13 de Setembro.
A primeira palavra vai para a excelente organização, imaginativa e irrepreensível: a jazz.pt decorou e reestruturou os dois espaços do Hot Club, o bar e normalmente desperdiçado espaço exterior das traseiras, para a realização de concertos múltiplos, entre os quais o público e músicos circulavam.

Lamentavelmente não me foi possível assistir aos concertos do primeiro dia do festival, o Ohad Talmor/ Steve Swallow/ Adam Nussbaum e os Red Trio de Hernâni Faustino, Rodrigo Pinheiro e Gabriel Ferrandini e Fundbureau.

O fim da noite do segundo dia trouxe consigo o melhor do festival (do que eu assisti) pela mão de David Binney (), um dos melhores saxofonistas alto da actualidade, também compositor e leader, bem conhecido do público nacional.
Binney esteve uma verdadeira «fera», ao nível do seu melhor, contagiando toda a sua banda de notáveis. Curiosamente o músico mais apagado foi o requisitadíssimo tenor de Mark Turner, sempre muito contido. Dan Weiss ameaça já os lugares cimeiros da bateria, contundente mas subtil, irreverente e excessiva, ao nível de um Jim Black, e Jacob Sacks esteve como nunca o tinha visto, com um virtuosismo digno de um bopper, sob uma forma que realmente respira a tradição Jazz, mas que amiúde parece reconhecer a paternidade de Cecil Taylor ou Paul Bley, ou deixa adivinhar a formação clássica. Surpresa realmente esteve no contrabaixo do seráfico Thomas Morgan, a verdadeira âncora do quinteto, ainda assim interveniente (intrometido?) e exuberante. Temas novos, aqui e ali a merecer alguma atenção nos arranjos, o que não chegou para baixar a classificação do concerto de excelente. Binney fechou também a noite de sábado da primeira semana.

Sábado que começou com uma desilusão com o concerto dos After Fall (). Não tanto talvez pelo trio Giardullo – Duboc – Sorgen (que nunca tinha visto tocar e que, apesar de não me ter convencido, eu reservo a minha opinião para outra ocasião), mas pelos músicos portugueses. Joe Giardullo esteve bem, embora sem grandes voos, e a secção rítmica demonstrou competência, mas Luís Lopes e muito em especial Sei Miguel estavam claramente desajustados. Em «casa de guitarristas» as opções «atonais» de Luís Lopes não convenceram (adiando também a minha apreciação), mas já a participação de Sei Miguel foi absolutamente desastrosa: uma postura pretensiosa apenas evidenciou a sua incapacidade de tocar num colectivo Jazz.

O Jazz, que voltaria ao fim da noite com o quinteto de David Binney ().

A segunda semana começou no jardim com o quinteto do guitarrista André Matos () com a jovem cantora Sara Serpa que lançava um primeiro disco – Rosa Shock – para a etiqueta Tone Of A Pitch. Música de grande formalismo e rigor, de execução irrepreensível, faltou-lhe a chama que incendeia as almas. Talvez que a sua transferência para o ambiente mais intimista do bar pudesse evidenciar a beleza ideal que a voz de Sara Serpa procura. Fica a dúvida.

Melhor esteve Afonso Pais () que lançava também Subsequências para a ENJA. É conhecida a paixão do guitarrista pela música brasileira, que é um dos motivos do disco, onde participa também Edu Lobo, com quem tem se tem apresentado com regularidade. Esta paixão de Afonso Pais é contagiante e revelou-se na riqueza harmónica e melódica e na alegria de tocar; mas o que é uma qualidade pode também ser um embaraço que o músico deve resolver. Com ele estiveram dois outros artífices de primeira linha: Nelson Cascais e Alexandre Frazão (o contrabaixista do CD é Carlos Barretto). A influência recíproca do Jazz e da bossa nova esteve patente nas subsequências do Afonso Pais Trio.

A herança de Eric Dolphy foi clara desde o primeiro minuto do concerto dos Jason Stein's Locksmith Isidore (), que pretende continuar as formas mais inovadoras de Dolphy no clarinete baixo, sobre que assenta toda a música do trio. Sem a exuberância ou a técnica de um Rudi Mahall, a projecção dolphiana de Stein perde-se no entanto algures na catástrofe free por onde (ele crê que) supostamente o Jazz deveria ter evoluído desde os anos 70. Ainda assim, e quando retorna a Eric Dolphy, o trio revela-se interessante.

O Happening (), nome talvez provisório de grupo, tem a sua maior originalidade na presença dos dois teclados, o piano acústico de João Paulo versus o teclado eléctrico de Júlio Resende, mas o grupo é ainda formado regularmente por Carlos Bica que por indisponibilidade foi substituído por Mário Franco, e ainda João Lobo e Luís Cunha, bateria e trombone.
A ideia do grupo assenta bastante na improvisação em palco sobre pequenos temas e nos contrastes tímbricos dos diferentes músicos e instrumentos. Projecto em evolução, instável por natureza, o concerto revelou interessantes possibilidades, ensombradas apenas pelo que me pareceu algum excessivo protagonismo de João Paulo que arrisca a apagar as restantes personalidades (e em especial Resende). A repensar.

O último dia do festival começou no espaço exterior do Hot com o projecto de José Peixoto «El Fad» ()). José Peixoto é um excelente guitarrista, como o vem demonstrando numa longa e sólida carreira. Este «El Fad», que se apresentou no jazz.pt com Carlos Zíngaro no violino, Miguel Leiria no contrabaixo e José Salgueiro na bateria, parece-me pecar sobretudo pela excessiva colagem ao «Jazz árabe» do libanês Rabih Abou-Khalil, e nem a presença de Zíngaro – que se relegou para um papel secundário - impede a comparação. Na comparação, pois, Peixoto fica a perder, já que Abou-Khalil é um virtuoso entre os virtuosos. Ainda assim, ele fez um concerto agradável.

Ainda no jardim tocou o ambicioso projecto de Pedro Moreira (), alegadamente inspirado em Schoenberg, e tocado por ele, Susana Matos Silva, André Fernandes, Nelson Cascais e André Sousa Machado. É óbvia desde a primeira nota a intenção erudita de Pedro Moreira, mas creio que este é um projecto que necessita de mais algum desenvolvimento: ao invés de aliar o Jazz com a música clássica ocidental, ele parece ficar a meio; nem uma coisa nem outra. A intenção de «tocar as pessoas» ficou adiada no jardim do Hot, presa a um excessivo formalismo e contenção em meio de algum pretensiosismo. Contenção do projecto que não permitiu que aquele quinteto de virtuosos se revelasse e gostaria, por exemplo, de ter visto soltar-se a fera que conhecemos na trompetista. Em 2006 assisti no Pequeno Auditório do CCB a uma concerto de Pedro Moreira de um combo de Jazz com um quarteto de cordas de nome «Jazz Allegro Dansabile». Creio que algo – alguma alegria? - se perdeu entretanto nesta fusão clássica – Jazz que Pedro Moreira persegue.

Os Tetterapadequ () que encerraram o festival têm a energia da juventude. Ideia de quatro amigos, entre os quais João Lobo e Gonçalo Almeida, parte de alguns temas, fragmentos de temas, para uma improvisação sem rede que tem a seu favor a sinceridade e o gosto pela aventura. A música parte por vezes de ambientes, dir-se-iam bucólicos, para resvalar para o mais puro noise. O seu futuro é uma incógnita, mas quando se é jovem, quem é que quer saber?
Os Tetterapadequ estiveram no Hot a lançar um disco para a Clean Feed.

Qui 4-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
Jazz.pt
Talmor/Swallow/Nussbaum

Ohad Talmor (st), Steve Swallow (b-el), Adam Nussbaum (bat)

23.45
Red Trio Portugal

Rodrigo Pinheiro (p), Hernani Faustino (ctb), Gabriel Ferrandini (bat)

Sex 5-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
Fundbureau

Stephan Meidell (g), Hugo Antunes (ctb), Luís Candeias (bat)

23.45
David Binney Quintet featuring Mark Turner

David Binney (sa), Mark Turner (st), Jacob Sacks (p), Thomas Morgan (ctb), Dan Weiss (bat)

Sáb 6-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
After Fall

Luís Lopes (g), Joe Giardullo (ss), Sei Miguel (t), Benjamim Duboc (ctb), Harvey Sorgen (bat)

23.45
David Binney Quintet featuring Mark Turner

David Binney (sa), Mark Turner (st), Jacob Sacks (p), Thomas Morgan (ctb), Dan Weiss (bat)

Qui 11-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
Jazz.pt
André Matos «Rosa Shock»
AM (g), Sara Serpa (voz), Demian Cabaud (ctb), Alexandre Frazão (bat)
23.45
Afonso Pais Trio «Subsequências»
AP (g), Nelson Cascais (ctb), Alexandre Frazão (bat)
Sex 12-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
Jason Stein’s Locksmith Isidore

Jason Stein (cl-b), Jason Roebke (ctb), Mike Pride (perc)

23.45
Happening

Mário Franco (ctb), João Paulo (p, f-r), Júlio Resende (p, f-r), João Lobo (bat), Luís Cunha (trb) + Maria João (voz)

Sáb 13-Set
Lisboa
Hot Club
22.00
José Peixoto «El Fad»
JP (g), Carlos Zíngaro (v), Miguel Leiria Pereira (ctb), José Salgueiro (perc)
23.00
Quinteto de Pedro Moreira
PM (st, ss), Susana Silva (t), André Fernandes (g), Nelson Cascais (ctb), André Sousa Machado (bat)
24.30
Tetterapadequ

João Lobo (bat), Gonçalo Almeida (ctb), Daniele Martini (s), Giovanni Di Domenico (p)