Demian Cabaud
How About You
CD TOAP 2011

José Pedro Coelho (st)
Miguel Fernández (st)
Demian Cabaud (ctb)
Marcos Cavaleiro (bat)
+
Leo Genovese (p)
Demian Cabaud (ctb)
Marcos Cavaleiro (bat
)

Tendo assistido ao concerto de apresentação de How About You de Demian Cabaud no Festival Jazz.pt em Dezembro passado, algumas observações me parecem oportunas: a primeira é a de que há concertos que mais valia não ter acontecido, a segunda é que muitos músicos tirariam mais proveito no estudo e reinterpretação dos clássicos ao invés de insistir em reportórios próprios e a terceira é uma pergunta: o que é o Jazz nacional?
Quanto à primeira observação, e na comparação com o disco, eu fico sem compreender o que se terá passado no Vinyl naquela noite de Dezembro, já que nada teve com o disco sobre que estou a escrever. How About You foi realizado por duas formações distintas: em trio com Leo Genovese ao piano e um quarteto com dois saxofones tenor, José Pedro Coelho e Miguel Fernandez. Em qualquer dos combos Marcos Cavaleiro foi o baterista e obviamente Cabaud o contrabaixo. Ora apenas o trio Cabaud-Cavaleiro-Coelho esteve presente no Vinyl, acrescido ocasionalmente pelo saxofone barítono, pouco sucedido, de Rui Teixeira. Referi a propósito do concerto a proximidade da fórmula Fly de Mark Turner, Larry Grenadier e Jeff Ballard.
No disco, no entanto, a presença de um segundo tenor torna esta minha referência absurda, mesmo se José Pedro Coelho é quase sempre um saxofonista muito contido. Mas os dois minutos e cinquenta e nove segundos do clássico de Ornette, Humpy Dumpty, são arrasadores e estão nos antípodas da estética Fly. Mas nos restantes quatro standards interpretados pelo quarteto, os dois saxofones dialogam, desafiam-se, complementam-se, de forma única, raramente ouvida no Jazz nacional.
O trio com Leo Genovese é igualmente digno de referência: na dissonante interpretação de When You're Smilling, no piano arrastado em Body and Soul ou na absolutamente genial recriação de Gallop's Gallop, este é um trio arrasador, e merecedor ele mesmo de um projecto individual.
Uma última nota para a prestação de Cabaud e Cavaleiro. Se os dois músicos vão sendo desde há muito dois incontornáveis da cena Jazz nacional, juntos eles são verdadeiramente notáveis.

Enfim, regressando às observações iniciais, ao longo da audição deste disco não deixei de lamentar que muitos músicos portugueses insistam em escrever novos temas, ao invés de explorar os clássicos. Será meritório, sem dúvida, esse esforço. Mas a verdade é que com frequência eles se deixam enlear em formalismos e barrocos que retiram a alegria à música. E note-se que a minha noção de clássicos é bastante alargada, já que pode incluir perfeitamente a moderna música pop ou erudita.

Quanto ao Jazz nacional, eu sempre me pergunto se vale a pena insistirmos nos nacionalismos e na protecção da música (e dos músicos) nacional. Quando abrimos a televisão ou a rádio e nos deparamos com tanta porcaria «made in Portugal», eu prefiro ser «internacional». Este é um bom exemplo do que eu digo: é um grande disco, feito por um argentino radicado em Portugal, com a colaboração de um catalão, um outro argentino e dois portugueses, gravado por uma editora nacional com um nome inglês. Enfim, pensem o que quiserem, eu não apoio a música nacional. Só a boa.

Regressando ao disco: How About You é um grande disco (quase dois discos, dada as formações distintas). Editado já no final do ano passado, ele arrisca-se a passar despercebido, mas merece toda a atenção dos jazzómanos.